Matéria de Perfil - Sr. Idilio

Matéria de perfil para o caderno "homenagens"; Revista ETHOS, ano 2, edição n°9.

Idilio Botaro

Dessas raras coincidências da vida, a palavra "idílio" vem do latim e significa "pequeno poema campestre"; "amor poético e suave". E nosso homenageado dessa edição da ETHOS conheceu, de perto, a dura suavidade do campo, a imensidão dos pequenos trabalhos diários e a poesia da música - privilégio dos que amam.

A estrada para Iguatemi, ao longe, somente cana e morros. A velha estação ferroviária está fechada, depois de ter servido como escola por muito tempo. O mato cresce onde, até 1966, estacionavam locomotivas a vapor. A plataforma da antiga estação parece ainda esperar pelo trem. Mas entre as pilhas de tijolos e os escombros da demolição da colônia que ali existia, há ainda lembranças de um descendente de italiano, de origem humilde e de gosto musical requintado.

Viúvo de Anna Moya Botaro, pai de Adalberto, Nelci, Mila, Joana e Paulo, e avô de Murilo, Guilherme, Enrico, João Vitor, Carolina e Gabriel. Idilio Botaro, feito um "pequeno poema campestre", nasceu no dia 04 de maio de 1930, no bairro Iguatemi, zona rural de Jaú. Quando pequeno, ao procurar tampinhas de garrafa pet para usá-las como brinquedo, em meio ao matagal, encontrou uma espécie de bomba, que explodiu na sua mão e lhe tirou dois dedos. Era essa a vida na colônia da região da fazenda de café Iguatemi, onde "não se via dinheiro, mas não se passava fome".

Sua escola foi só o primário. As crianças estudavam o ano inteiro para realizarem uma prova que era aplicada, todo final de ano, por um inspetor da cidade de Jaú. Parou os estudos cedo para trabalhar nas fazendas de café que por ali tinham, cumprindo tarefas de carpinteiro e marceneiro. Idilio nunca teve medo do trabalho e lembra com carinho que, apesar da rotina árdua, muitas festanças aconteciam nas redondezas. Na fazenda São João, o dia de São João era o principal do ano. No Bairro do Bom Retiro comemorava-se o sábado de Aleluia e na Fazenda Iguatemi, o dia de São Pedro. As bandas encarregadas de animarem as festas - com muito baião - eram compostas por moradores da região. Todos os homens da sua família foram músicos e seu pai também tocava clarinete nas festas das fazendas. O gosto prevaleceu no sangue de Idilio que começou, aos 26 anos, a tocar trompete.

Tocou nas Bandas Musicais Municipais de Mineiros do Tietê, São Manuel, Barra Bonita e na orquestra Capelozza, de Jaú. Ano a ano as bandas se renovavam. Integrantes saíam e entravam, mas ele continuava ali. Pendurou o trompete com 70 anos, completando 44 anos de "bom gosto musical". E afirma: "Acho que, hoje, está faltando um pouco de 'cultura'. Ouvir uma orquestra sinfônica é a coisa mais gostosa que tem". Os integrantes da Banda Municipal de Barra Bonita, todos uniformizados, levavam a "arte" para o povo todas as manhãs de domingo, as margens do rio Tietê. Começavam o espetáculo às dez horas e, ao meio dia, acompanhado das baladas do sino da Igreja Matriz de São José, o maestro dava o sinal e o concerto terminava.

E esse homem que tanto trabalhou e pela vida tocou conta que "as músicas eram dançantes e todos acompanhavam a letra. No salão, havia o mestre-sala. Se alguém fizesse algo de errado ele pegava pelo colarinho e o levava para fora. Os corsos que aconteciam nas ruas, antes da festa no salão, eram lindos. Máscaras, marchinhas, confetes e serpentinas enfeitavam as cidades".

Idilio mudou-se para Barra Bonita, aos 44 anos, para trabalhar com seu irmão Carlos Botaro. Depois trabalhou no porto de areia João Rays, por 19 anos. Abriu a oficina de concertos em 1984, quando se aposentou. Concerta móveis, panelas e faz pequenos trabalhos de marcenaria. Perdeu a mulher faz pouco tempo e disse que "precisa se distrair, por que senão a vida fica 'pesada'". E entre "concertos e consertos", carregando alegrias e fardos, leva a vida como o figurino pede: vivendo. Mesmo que na vida muita coisa não tenha "conserto", como ele mesmo disse: a vida está aqui para ser vivida.